Legislação sobre criptomoedas no Brasil: ela precisa existir?
Ainda rodeadas de mistério e dúvidas, as criptomoedas – ou moedas digitais – só não caíram no gosto popular, porque, de fato, exigem um pouco mais de conhecimento técnico e tecnológico do promitente investidor.
Como são moedas virtuais, foram genuinamente criadas para não estarem sujeitas à interferência das instituições estatais ou de corretoras e bancos internacionais. E é exatamente pelo fato de se consubstanciar em um investimento que não comporta lastro, que a sua regulamentação é tão escassa quanto imatura.
O avanço nos debates a respeito da normatização e sobre o compliance envolvendo as transações ainda aguardam um ambiente propício, na medida em que as criptomoedas sofrem críticas ferrenhas dos que as veem como um investimento inseguro, volátil, destituído de garantias, invasivo na economia, e muitas vezes, ensejador de fraudes.
O que são? De onde vêm? De que são feitas?
As criptomoedas surgiram com o escopo precípuo de criar um sistema financeiro alternativo, independente e regulado pela própria economia, e que não estivesse sujeito à pressão política, à crises institucionais – como do banco central, por exemplo – e econômicas – pois independe de oscilação do valor da moeda comum ou da inflação.
As moedas digitais são criptografias resolvidas por meio da utilização de dezenas de computadores. Cada moeda que esse processo gera é única e dessa forma, apenas quem tem a moeda pode transferi-la e isso acontece sem a presença de intermediários (bancos, corretoras, governo ou agências).
Elas estão armazenadas dentro de um banco de dados global e não centralizado e cada um dos computadores conectados serve como um banco de dados.
As moedas têm valor monetário, mas não tem cédula, governo ou economia nacional para regularizá-las.
A quantas anda a regulamentação das criptomoedas no Brasil?
As próprias características que distinguem as criptomoedas das demais ensejam a lacuna normativa que hoje existe, não só no contexto nacional, mas também no cenário legislativo global. Isso porque, os defensores da ausência de uma formalização, alegam que o mercado de moedas virtuais, e somente ele, é capaz de suprir e regular suas demandas e deficiências. Como uma “autoregulamentação”.
Todavia, com a expansão do número de pessoas que têm tido acesso às essas operações financeiras pelo meio digital, os governos tiveram a iniciativa de fomentar o debate sobre a necessidade da normatização do tema, sob o argumento de que se faz necessário proteger o investidor.
No Brasil, o assunto tem sido discutido legalmente a partir de duas vias principais: o Projeto de Lei 2303 de 2015, e a jurisprudência.
O que diz o pl 2303/2015?
De autoria do deputado federal Aureo, a proposta trata:
- Dos chamados “arranjos de pagamentos”, nos quais se incluem, pelo projeto de lei, os que aceitam moedas virtuais, sob supervisão do Banco Central;
- Da abrangência da fiscalização pelo COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) estendida às operações que envolvem moedas virtuais;
- Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor nas relações surgidas a partir dessas transações.
O projeto de Lei ainda encontra-se em andamento na Câmara e é objeto de inúmeras audiências públicas com o escopo de colacionar os malefícios e os impactos que esse novo sistema de pagamento pode gerar na economia do país, nas relações consumeristas e até mesmo, no âmbito criminal, pois podem estar sendo utilizadas para fins de lavagem de dinheiro ou para auxílio nas transações provenientes do tráfico de drogas.
As recomendações datadas do ano de 2012 pelo Banco Central Europeu culminaram em um Relatório Sobre Moedas Virtuais, cujas diretrizes acabaram por influenciar a proposta legislativa brasileira.
Segundo o documento, a necessidade de regulamentação imediata é diretamente relacionada ao crescimento da amplitude de adoção dessas moedas virtuais, consideradas instáveis e voláteis quando trocadas por moeda local.
O relator da Comissão Especial criada para discutir o assunto na Câmara dos Deputados chegou a levantar a hipótese de coibir o uso das moedas virtuais em território Brasileiro sob a fundamentação de que “causam sérios problemas no âmbito da defesa da economia popular e da defesa do consumidor”.
O fato é que o projeto ainda não tomou os rumos de que precisa para se tornar lei, muito mais pela ignorância real e técnica acerca do tema e de seus desdobramentos econômicos, do que por impacto no contexto das transações financeiras modernas.
Se não tem lei, tem o quê?
Por enquanto, apenas atos instrutórios e normativos internos. O Coaf já assumiu posição favorável à regulamentação sobre as moedas virtuais e pela fiscalização ativa pelo Banco Central.
O Banco Central, por sua vez, em 2017, publicou um comunicado no qual afirma que as moedas digitais:
“não são emitidas nem garantidas por qualquer autoridade monetária, por isso não têm garantia de conversão para moedas soberanas, e tampouco são lastreadas em ativo real de qualquer espécie, ficando todo o risco com os detentores. Seu valor decorre exclusivamente da confiança conferida pelos indivíduos ao seu emissor”.
A Receita Federal do Brasil não reconhece as criptomoedas como moedas e alerta para o fato de que devem ser declaradas na Ficha de Bens e Direitos como “outros bens”, já que, na visão do órgão, podem ser equiparadas a um ativo financeiro. Além disso, prescreve:
“Os ganhos obtidos com a alienação de moedas virtuais (bitcoins, por exemplo) cujo total alienado no mês seja superior a R$ 35.000,00 são tributados, a título de ganho de capital, à alíquota de 15%, e o recolhimento do imposto sobre a renda deve ser feito até o último dia útil do mês seguinte ao da transação.”
E a jurisprudência, o que diz?
Os casos levados à apreciação judicial até hoje basicamente apenas tratam da possibilidade das exchanges – que são plataformas digitais que facilitam transações por criptomoedas – terem suas contas em Bancos encerradas sem qualquer justificativa das instituições financeiras.
A jurisprudência é pacífica quanto ao fato de que é permitido aos Bancos, sem qualquer óbice, fechar uma conta de forma unilateral e sem qualquer justificativa, uma vez que não poderia ser obrigado a manter uma conta que não fosse do interesse da instituição.
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E no fim das contas? Como saber o que está certo e o que está errado?
A conclusão, enfim, é a de que se aplica a máxima jurídica que preleciona: “o que não é proibido, é permitido”.
O avanço da tecnologia e da inovação em investimentos desprendidos da instabilidade econômica e política elevaram, certamente, a um novo patamar o tema das criptomoedas e a respectiva regulamentação por órgão governamental.
Se por um lado alguns defendem que a própria transação em si é autossuficiente e não demanda normatização externa, por outro a formalização de uma legislação estatal abriria os braços para os inseguros, carecedores de um mínimo de confiança.
Por hora, os investidores e os curiosos deverão se ater à autonomia regulamentar do mercado de moedas virtuais.
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